Nos
antigos tempos romanos havia uma aldeia onde o desporto era praticado com
afinco, dedicação e muito empenho, mobilizando tudo e todos em torno de uma
tradição milenar: o Ginjabol.
Estes
embates preparavam-se durante semanas, com estágios parcelares nas melhores
adegas do país e idas regulares às missas dos Adventistas para ensaio dos cânticos
de claque. Versavam sobre os mais variados temas com títulos sugestivos como “As bolas dum anjo”, “Levado pelo pé,
com Jesus eu vou”, “A falta do pecador” e sempre a
terminar, o épico “Dia do Apito final”.
No próprio
dia do jogo, as forças policiais dispunham-se em bloco em torno das roullotes
mais importantes, para permitir a entrada de uma forma ordeira e sóbria no recinto. À polícia montada estava reservado o show erótico,
que antigamente era perpetrado pelas manas Romanov e sua caniche da Tasmânia.
Toda a festa se montava em redor da praça de touros onde decorria o jogo.
Desde
os cuspidores de fogo que eram aproveitados para assar os frangos no espeto, às farturas radioactivas com dupla camada
protectora, ao algodão doce com grumos de cevada, às entremeadas de lípidos polinsaturados, e até às bifanas sagradas da porca
da Marinela, todos se uniam alegremente ao circo montado. Era curioso constatar
que lado a lado conviviam os vendedores de cachecóis, bandeiras, pins, sapatos,
verdura, andaimes, chámon e sanitários.
Geralmente
era desta aldeia a equipa que defrontava a selecção nacional da Lusália,
constituída na altura por jogadores cirróticos e barrigudos com alta agilidade
para o jogo mental de cultura védica.
Quando
os machos jogadores da selecção entravam em campo com os seus ursinhos de
peluche, robe, pijama e rolos no cabelo, eram entusiasticamente recebidos com
mousses vegetais, óleos de sebo de
girafa, algálias de longa duração, e exfoliantes de casca de tremoço
das raras quintas capitalistas e feudais de Corroios.
Dentro
do estádio, dum lado do campo posicionavam-se os melhores representantes dos
Lusálios, enquanto do outro se colocavam os anões da Beira Baixa. Esta casta
conhecida carinhosamente pelos “Beirinhas”, era sempre um adversário aguerrido,
famoso pelos seus golpes de cabeça no baixo-ventre quando os ânimos lhes subiam à guelra. Com um centro de
gravidade mais baixo, conseguiam muitas vezes passar pelos entrefolhos dos
adversários, fintando-os com dribles de ballet ucraniano.
Este
jogo original, desenrola-se por tradição numa arena circular com três orifícios
na zona central com cerca de 8cm de diâmetro. Cada equipa é constituída por 7 elementos que rotativamente aplicam a
sua jogada. Em cada uma destas jogadas se bebe uma ginjinha, seguida de um lançamento
do respectivo caroço a partir de vários círculos a
diversas distâncias
dos tais orifícios centrais, tentando neles acertar. Os círculos mais distantes
dos orifícios centrais dão uma maior pontuação, pelo que essas apostas são
habitualmente utilizadas pelos jogadores com maior capacidade de sopro, e em
alturas onde se pretendem recuperações de desvantagens no marcador.
Há no
entanto várias técnicas de arremesso do caroço: uns enchem o peito de ar e
cospem com precisão militar o caroço, outros lançam o caroço na vertical e de
seguida chutam-no, e outros há ainda que tapam uma narina e fecham a boca,
arremessando o mini esférico pela narina oposta. Nestas ocasiões o caroço é envolvido
por um ranho verde e viscoso que permite uma aterragem com maior acerto, pois o
atrito é maior.
Em
extremos diametralmente opostos da arena, coloca-se a equipa técnica de cada
uma das selecções, com toda a parafernália necessária ao decorrer do
jogo. Uma vez que este se pode prolongar durante horas,
a máquina
de imperiais é essencial para que se mantenha uma boa hidratação dos jogadores,
enquanto o tradicional banco de suplentes é substituído por mesas corridas onde
abundam os leitões assados, javalis no espeto, codornizes de Albufeira, salada
de frutas e chamuças gigantes. O grupo de assistência técnica
é formado por massagistas faciais, ensaiadores de sopro, psicólogos de sábado, quiromantes, cartomantes e especialistas
de decoração Feng-Shui.
Neste
tipo de provas, a equipa fixa de arbitragem é habitualmente constituída por dez
elementos, uma vez que têm de ser regularmente substituídos. Em cada lançamento
de cada uma das equipas, o árbitro principal brinda e ingere a ginja e o caroço.
Os que têm um maior índice de massa corporal suportam várias jogadas
seguidas, mas quando começam a andar de gatas para validar os caroços nos
buracos, têm de ser rapidamente substituídos. Há os que suportam e aguentam bem
o licorzinho, mas que por vezes se deparam com a tripa tão atafulhada de caroços que têm de
desistir por cólicas.
Nestas alturas, a bolsa de apostas do mercado negro incide sobre o número de
jogadas que cada árbitro irá suportar, sendo
excluídos aqueles que recorrem ao uso de doping como suplementos de água del
cano.
Nestes míticos
jogos, os únicos penaltis que existiam eram os efectuados pelo melhor jogador
da equipa da Lusália, conhecido como “Mikas Sarrasqueiro”, que desempenhava os
chamados penaltis invertidos, famosos pela arrojada cambalhota e arremesso da
pevide ao buraco. Um portentoso jogador era também o “Sanfonas”, que de tão rápido que era a
engolir a ginja, até tragava o caroço. Outra verdadeira lenda do Ginjabol: o “Hammer”!
Uma pontaria certeira, umas trajectórias elípticas, o maior número
de jogadas seguidas sem cair em campo. Tornou-se uma verdadeira imagem de marca
ter sempre o bacalhau assado e a máquina de imperiais por sua conta...
O jogo
podia durar horas a fio, mas mesmo quando se dava por terminada a disputa, que
ocorria quando 2/3 dos elementos de uma das equipas ia parar ao Hospital, a vitória
era celebrada num qualquer recanto da aldeia com alegria e boa disposição.
Estes
torneios e toda a sua envolvência, eram no fundo um dos maiores motores impulsionadores
do socialismo.
Toda a parafernália e agitação que mobilizavam, ainda hoje são sede de
cruzamentos intergeracionais que constituem a base de toda uma estrutura
populacional e que permite consolidar a verdadeira essência dum povo à luz da
teoria do fole: a sua alma!
Viva o
desporto!